AINDA
Dizer urgente do amor ao amante.
Antes que se quebre o tempo.
E os ouvidos, dissolvidos na terra,
não apreciem mais a carícia das sílabas.
Antes que as mãos, tímidas de dar,
cessem de vez os movimentos,
e todos os gestos virem ossos.
Dizer urgente ao amigo o valor do vínculo.
Que só o amigo costura.
Só o amigo, cozeduras, cozimentos, cerziduras.
Que só o amigo estanca os sangramentos.
Dizer urgente do amor, sem resistências.
Antes que a língua, de súbito, se cale.
E o amor, preso por reticências, maledicências,
medos, mágoas, role pelos ralos.
Antes que o amor, quedado pela foice,
Faça da palavra não dita, eterno açoite.
Carmen Moreno (Livro LOJA DE AMORES USADOS)
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